O relatório, realizado no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, analisa a transmissão da pobreza de pais para filhos, discutindo os vários motivos que a podem desencadear: nível de escolaridade, situação laboral, composição do agregado familiar e outras situações sociodemográficas (como, por exemplo, nacionalidade e privação material). Este estudo, nota complementar do projeto Portugal, Balanço Social, da autoria de Bruno P. Carvalho, Miguel Fonseca e Susana Peralta, do Nova SBE Economics for Policy Knowledge Center, usa dados do módulo especial do "Inquérito as Condições de Vida e Rendimento de 2019 (ICOR)", que recolhe informação junto de cada respondente acerca da sua situação económica presente e do seu agregado quando tinha 14 anos.
A escolaridade do pai tem um impacto determinante na situação de pobreza dos filhos quando adultos. As pessoas cujo pai completou apenas o ensino básico são duas vezes mais afetadas pela pobreza do que aquelas cujo pai completou o ensino secundário. Entre os adultos cujo pai tinha ensino básico, apenas 20 % completam o ensino superior; esta percentagem sobe para 58,5 % e 75,6 % para adultos com pais com ensino secundário ou superior, respetivamente. Assim, “ter um pai com ensino superior quase quadruplica a probabilidade de um adulto ter ensino superior”, conclui o relatório.
No que se refere à situação laboral, o estudo revela que um em cada quatro adultos que, aos 14 anos, tinham um pai desempregado é pobre. Isto sugere que “a situação laboral dos pais é determinante para a situação de pobreza dos filhos, quando atingem a idade adulta”. A profissão dos pais também é relevante: filhos de agricultores e de trabalhadores não qualificados têm uma taxa de risco de pobreza três vezes maior do que os filhos de especialistas das atividades intelectuais (22 % e 7 %, respetivamente).
No que diz respeito à composição do agregado familiar, os adultos oriundos de famílias monoparentais têm uma probabilidade de 20 % de serem pobres. Para os adultos que, aos 14 anos, viviam em famílias numerosas, esta probabilidade é de 23 %. As pessoas adultas que não viviam com o pai aos 14 anos têm uma taxa de pobreza de 17 %, que aumenta para 23 % caso não tenham qualquer contacto com o pai.
A situação financeira do agregado também é um determinante importante da transmissão intergeracional da pobreza. Uma em cada quatro pessoas que cresceu num agregado com uma má situação financeira é pobre. Além disso, um em cada três adultos cuja família não conseguia satisfazer as suas necessidades de material escolar aos 14 anos é hoje pobre (nos adultos cuja família conseguia satisfazer estas necessidades a taxa de pobreza baixa para metade). Os adultos cujas famílias não conseguiam garantir uma refeição proteica diária enfrentam uma taxa de pobreza de 22 %, mais do dobro da verificada nas restantes famílias (10 %). “Adultos que viviam em agregados com privação na satisfação de necessidade escolares e alimentares têm taxas de pobreza mais de duas vezes mais altas do que aqueles sem privação”, referem os investigadores. Por último, um em cada quatro adultos que viviam em instituições de acolhimento aos 14 anos é pobre.
Uma comparação entre as gerações nascidas nas décadas de 60, 70 e 80 indica que os adultos que viviam, aos 14 anos, em agregados com boa situação financeira têm taxas de pobreza entre 11 % e 13 %, independentemente da década em que nasceram. Para os adultos que viviam em agregados com má situação financeira, as taxas de pobreza variam entre 22 % e 24 %. Assim, a diferença na taxa de pobreza dos adultos que viviam, aos 14 anos, em agregados com boa ou má situação financeira é sistematicamente de entre 11 e 12 pontos percentuais, independentemente da geração considerada. Logo, “não há evidência de que a transmissão intergeracional de pobreza esteja a diminuir”.
Por fim, é importante reforçar que os investigadores analisam outras situações sociodemográficas que podem condicionar a taxa de pobreza dos respondentes como a nacionalidade (um em cada quatro filhos de imigrantes é pobre) e o grau de urbanização da zona onde os pais viviam (os adultos que cresceram em áreas rurais têm maior risco de pobreza).
Pode ler o relatório na íntegra aqui.