Ainda vamos a meio desta pandemia que, bruscamente, invadiu o nosso país e as consequências económicas já são as catastróficas. Não será preciso esperar pelos dados do Instituto Nacional de Estatística e de dados mais fiáveis do Banco de Portugal, ou leras previsões de banda muitíssimo larga das Universidades ou das consultoras, para concluir que vamos atravessar a pior crise deste século.
A paralisação de grande parte da economia, a fuga dos viajantes, a quebra nas exportações e as dificuldades em retomar, sobretudo, o turismo, vão prolongar a agonia da hotelaria, da restauração e similares e de todos os serviços associados a este setor que, nos últimos anos, foi o motor do nosso crescimento e que arrastou outros áreas como a construção civil com a reabilitação urbana para o alojamento local e a edificação de novas unidades hoteleiras, criando emprego e riqueza.
Os estudos e sondagens já realizadas indicam que os cidadãos dos principais mercados emissores de turismo para Portugal, como a Alemanha e a Grã-Bretanha, vão cortar nas suas despesas familiares e que as viagens para o estrangeiro estão no topo das poupanças. Estes países tenderão a incentivar o turismo interno. Se esta situação se confirmar, a nossa recessão económica vai arrastar-se por muito tempo, com efeitos nefastos no tecido social do país e das suas regiões.
Enquanto, a crise de 2011 teve vários anúncios e foi fruto da falência de parte do sistema bancário mundial e da elevada dívida de Portugal, que vinha sendo denunciada desde há muitos anos, esta crise entrou-nos bruscamente pela casa dentro e nós, ainda, não sabemos bem como enfrentá-la. Na anterior, apesar dos paliativos dos sucessivos PECs, todos já tínhamos consciência do que vinha a caminho e não era nada de bom, e lá nos fomos preparando para o pior e adaptando os orçamentos familiares aos cortes nos salários e nas pensões e ao brutal aumento de impostos. Isto é, financeira e psicologicamente, fomos preparados para o piore além disso as medidas de austeridade foram sendo tomadas de forma gradual. Acresce que muitos países ficaram imunes a esta crise e assuas importações de Portugal ajudaram a minimizar o nosso drama.
A situação roçou a severidade, muitas empresas encerraram, o desemprego subiu, a pobreza aumentou, mas a verdade é que em 4 anos, o país cumpriu o acordo com a troika, levantou-se do chão e recuperou rapidamente.
As duas realidades, devido às suas origens e tempos, não são comparáveis, mas preocupa-me a falta de medidas de apoio ao setor social que foi crucial no apoio aos mais vulneráveis na anterior recessão. É evidente que todas as decisões já tomadas de apoio ao tecido empresarial e à manutenção do emprego, são bem-vindas, mas algumas como as dos apoios aos chamados recibos verdes, aos precários e aos profissionais liberais, são claramente insuficientes.
Há um outro aspeto que tem sido pouco abordado que é o da economia informal, ainda muito significativa, muita dela fora do sistema tributário e de segurança social, mas que ocupa muita gente, como pequenos agricultores, feirantes, empregadas domésticas, e que de um momento para outro se veem sem qualquer rendimento ou apoio social.
A seguir a este coronavírus virá o vírus das falências, do desemprego e da pobreza e temos que estar preparados para responder à miséria que vai de novo invadir o país. Apesar do confinamento, sabe-se que há portugueses a passar fome, até porque muitas das IPSS que respondiam às necessidades dos cidadãos mais vulneráveis, estão já com poucos alimentos, já não recebem os excedentes dos hotéis e dos restaurantes, não podem fazer as habituais recolhas à porta dos supermercados e muitos dos seus voluntários também têm receio de serem seus voluntários também têm receio de serem infetados.
Um estudo da Nova School of Business and Economics indica que 80% das organizações sociais portuguesas já tiveram uma quebra nas receitas superior a um terço e que as despesas não param de aumentar, passado apenas um mês do emergir da pandemia.
O Parlamento da Madeira de que sou o primeiro titular decidiu cortar nas despesas de funcionamento e em aquisições de equipamentos, dirigindo essas verbas para apoiar o Banco Alimentar Contra a Fome e outras instituições. Para situações excecionais, medidas excecionais.
Esta crise vai ser mais duradoura e mais severa que a última e o Governo deve, com a máxima celeridade, criar um pacote de apoios às instituições Particulares de Solidariedade Social, associações que estão mais próximas da realidade, que sabem quem são as famílias carenciadas e aqueles que realmente vão passar fome e privações. Muitos serão os idosos que sobrevivem com pensões baixas no interior do país ou nos bairros sociais das periferias das cidades.
Aqui as paróquias e as instituições da Igreja Católica podem desempenhar um papel fulcral na minimização do sofrimento dos mais doentes e dos mais frágeis, pois conhecem a verdadeira realidade que os “burocratas da solidariedade” ignoram porque muitas vezes não descem ao terreno. Sejamos claros: algumas ditas Organizações não Governamentais desperdiçam o dinheiro público em despesas administrativas, em salários e em campanhas de marketing, esquecendo o verdadeiro objeto para o qual foram criadas, que é o da ajuda aos mais carenciados. Ainda há dias, o Papa Francisco, alertava para esta situação que é preciso denunciar porque muitas dessas instituições vivem de dinheiros públicos e das ajudas dos cidadãos e das empresas.
A sociedade portuguesa tem que mobilizar-se para esta enorme tarefa de entreajuda entre todos, até porque muitos - desculpem a expressão - vão baixar de “categoria”, pois irão aparecer novas classes de pobres, pessoas que de um momento para outro, pelo encerramento de empresas, falta de trabalhou ou emprego parcial, verão os seus rendimentos baixar drasticamente e passarão por enormes dificuldades. Uma situação só na aparência semelhante à crise de2011, já que na altura a situação atingiu todos por igual, com perda de acentuada de rendimentos, enquanto agora quem trabalha para o setor público poderá salvar-se e os privados apanharão com todos os sacrifícios. Daí a urgência de medidas sociais arrojadas, inovadoras e mais dirigidas a cada família, em vez de decisões igualitárias e uniformizadas, que só agudizam injustiças, pois tratam da mesma forma aquilo que é diferente.
Nunca foi tão importante unir todos, Estado e comunidade, maiorias e oposições, associações empresariais e sindicatos, patrões e trabalhadores, autarquias e famílias, IPSS e Igreja, num esforço gigantesco para suplantar esta crise, evitando que se passe de uma recessão a uma depressão económica. Não há economia sem pessoas!
A seguir ao isolamento social só pode seguir-se a fase da solidariedade social. Evitar uma “pandemia de pobreza” na nossa sociedade é um imperativo nacional.